quarta-feira, março 21, 2007

Assim que a porta bateu o menino ficou em seu quarto azul, semi-azul na verdade, esperando algo. Algo que se definia na briga da cortina com o vento. Era noite. Não se espera muitas coisas a noite(muitas coisas externas). A noite estava quente, no fundo se ouvia o barulhinho de gotas tocando o chão, e o cheiro de terra limpa, ele queria sair naquelas gotas, sentir as gotas, como fizera meses antes, despreocupado com o momento, com as horas, apenas sentindo as gotas tocarem seu corpo... Mas agora estava no quarto, esperando, algo que não viria tão cedo, não viria na chuva ou não viria simplesmente em momento algum. Esperou um pouco mais nesse clima, até que resolveu colocar aquele cd pra tocar. Aquele cd tinha sido presente de um amigo, haviam umas 20 musicas no cd, apenas 5 ou 6 tinham voz... Era trilha de um filme de cowboys gays.. Ele adorava aquele cd. Colocava ele sempre a noite, e ouvia, ansioso pra ouvir a faixa que tinha a musica da mulher que falava coisas interessantes, no sentido de comuns. As vezes coisas comuns são interessantes.

(- Você gosta dessa musica? Ela te faz lembrar alguém?
- Hum.. Não necessáriamente, eu gosto dessa musica, mas a história dela é comum, cabe a qualquer casal, eu não lembro de alguém, mas eu entendo do que se trata...)

Em determinado momento, como sempre ocorria ele dormiu na faixa anterior a sua favorita. Dormiu. Dormiu um sono desconfortável. Sono de calor. Sono de pernilongos e coceiras. Sono de suor. Sono de delirios.. Esses tipos de sonos são sonos de delirios. Ele dormia, mas dormia acordado, sentia o que acontecia ao seu redor, e sentia o que lhe acontecia em seu interior, ao acordar aquilo sempre se misturava, de uma maneira a deixar ininteligivel o que era sonho do que era realidade. Acordou desse sono, como sempre com a cabeça pesada, com sede... Levantou, cambaleou um pouco atá a porta, tateando o quarto, pra não trombar com o móvel que estava perto, que ele sabia/sentia estar perto, trombar seria questões de minu..(trombou). Desviou.
Se livrou do quarto, o cd já tinha acabado, havia dormido uns 40 minutos, tempo suficiente para devaneios. Bebeu água e como sempre depois disso assistiu um pouco de TV. A TV na verdade era uma desculpa para fugir do quarto azul, semi-azul na verdade, porque naquele quarto ele sabia existir seres novos. Seres que não existiam antes. Seres-crianças. E ele sempre odiou esse tipo de criança, do tipo manipuladora. Ele ia ficar acordado esperando a criança dormir, ela teria que dormir um dia. Seu quarto seria seu de novo um dia. E ele pintaria ele de laranja. Só que ainda não era o momento. A criança dormia sempre pelas 2:30 mais ou menos. Dormia no chão. Era uma criança vermelha, invisivel, e vermelha ao mesmo tempo, invisivel e gorda, invisivel e alta. Seus olhos grandes, suas mãos grandes. Ele tem medo dessa criança. Eu tenho medo dessa criança.

Um comentário:

Anônimo disse...

Uau!!! Até eu tenho medo dessa criança!
Gostei, gostei mesmo, achei denso e a descrição do ambiente dá todo o tom (azul, laranja, vermelho).
Muito criativo Juan!
Ah e obrigada pelo comentário, as vezes eu sinto que poucas pessoas realmente entendem o que eu quero dizer! e vc captou perfeitamente!
Valeu
Beijos